Manifesto dos Intelectuais Acadêmicos Contra a Construção do Aeródromo Harpia em Parelheiros



Local onde se pretende construir o aeródromo


Manifesto 

Porque é errado instalar um aeródromo em Parelheiros, área de produção de água da cidade de São Paulo 

Introdução 

Pesquisadores, doutores ou titulares, especialistas reconhecidos em diversas universidades brasileiras vêm a público manifestar seu desacordo com o projeto de instalação de um Aeroporto na região de Parelheiros, ao sul do Município de São Paulo, devido a estar a iniciativa em total conflito com a legislação municipal, estadual e federal, conforme exposto a seguir. 

O uso proposto é incompatível com o zoneamento municipal, com diversas leis estaduais de proteção ambiental e de mananciais e com o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (Lei Federal 9985/2000). 

O projeto de implantação de um aeródromo em Parelheiros para atender jatos executivos e companhias de táxi aéreo, denominado de Aeródromo Rodoanel, se aprovado, seria instalado em uma área de aproximadamente 100 hectares, localizada às margens da represa Guarapiranga, mais precisamente em um espaço contiguo à Várzea do Rio Embu-Guaçu e ao Parque Ecológico da Várzea do Embu-Guaçu, principal tributário dessa Represa, que abastece 3,7 milhões de pessoas das zonas Sul e Sudoeste da capital (conforme a Sabesp). 

Chama a atenção o fato de o projeto não possuir sustentação legal e sua eventual aprovação implicaria afrontar as leis e normas que regem o uso do solo urbano no município de São Paulo, posto que a região, conforme o artigo 167 da Lei Municipal 13.430/2002 e artigo 109 da Lei Municipal 13.885/2004, que institui os Planos Regionais Estratégicos das Subprefeituras e disciplina o parcelamento, o uso e a ocupação do solo do Município de São Paulo, é considerada uma Zona Especial de Proteção Ambiental (ZEPAM) e Zona de Proteção e Desenvolvimento Sustentável (ZPDS), não compatível com a implantação de uma infraestrutura aeroportuária.

A aprovação prévia pela Secretaria Nacional de Aviação Civil, em 26.07.2013, se refere meramente ao espaço aéreo, enquanto que a localização do empreendimento deve ser compreendida no contexto dos interesses do município conforme estabelecido no seu Plano Diretor.
Frisa-se que, de acordo com os artigos 30 e 182 da Constituição Federal, é competência municipal legislar sobre a política de desenvolvimento urbano, por meio de Plano Diretor Municipal e leis de uso e ocupação do solo. 

Apesar da negativa da Licença de Instalação por parte da Prefeitura de São Paulo em 31.07.2013, reiterada em 18.12.2013, justamente porque o projeto não é compatível com a legislação em vigor, e de duas negativas do Tribunal de Justiça em fevereiro de 2014, conforme divulgado na imprensa, os empreendedores insistem na aprovação do empreendimento.

Mas, além de não ser viável perante a legislação municipal, o projeto do Aeródromo Rodoanel, proposto pela empresa Harpia Logística Ltda., também infringe normas estaduais e nacionais.

1- O empreendimento foi planejado para uma área caracterizada como Zona de Amortecimento de importantes Unidades de Conservação de Proteção Integral, conforme o que dispõe a Lei Federal nº 9.985/2000 que disciplina o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC). A obra pretendida afetaria diretamente a Zona de Amortecimento (ZA) das seguintes Unidades de Conservação (UCs): Parque Natural Municipal do Jaceguava, Parque Natural Municipal do Itaim, por estar a menos de três quilômetros de distância dos limites destas UCs. Além disso, também se encontra na ZA do Parque Natural Municipal da Cratera da Colônia. Indiretamente, o empreendimento impactaria também as seguintes UCs: Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) do Curucutu, Parque Natural Municipal da Varginha, Parque Natural Municipal do Bororé, Área de Proteção Ambiental (APA) Capivari-Monos e Apa Bororé-Colônia. 

2- O projeto está em desacordo com a Lei Federal nº 12.651/12 no que se refere às Áreas de Preservação Permanentes (APPs), pois prevê edificações sobre nascentes (existem 15 no local, segundo dados constantes na Carta Topográfica da Emplasa). Também fere a Lei Federal nº 6.766/79, que dispõe sobre o Parcelamento do Solo Urbano por ocupar essas áreas onde é proibido urbanizar (art.3º). E fere o artigo 197, inciso II da Constituição Estadual que protege as matas ciliares.
Como se não bastasse, transgride a Lei Estadual nº 12.233/06 (Lei Específica da Guarapiranga), que define a Área de Proteção e Recuperação dos Mananciais do Guarapiranga (APRM-G), e é manifestadamente incompatível com as chamadas Subáreas de Ocupação Diferenciada, que se destinam ao uso da agricultura orgânica, cultura, lazer, turismo, educação e valorização cênica e paisagística. 

3- O imóvel em que se pretende instalar o projeto localiza-se em uma Região pertencente ao Bioma Mata Atlântica, sendo que a maior parte da área a ser ocupada pelo empreendimento é formada por vegetação secundária em fase de regeneração. 

A vegetação arbórea existente no local é classificada, em grande parte, como Vegetação de Preservação Permanente (VPP) conforme Lei Municipal nº 10.365/87, que se refere à vegetação arbórea quando constituir bosque ou floresta heterogênea que forme mancha contínua superior a 10.000 m². Enquadra-se ainda nessa categoria a vegetação arbórea na faixa de 20 metros de cursos d’água, bem como de nascentes, minas ou olhos d’água. 

Já a Constituição Federal no artigo 224, parágrafo 4º, confere à Mata Atlântica a categoria de Patrimônio Nacional. 

E o Artigo 196 da Constituição Estadual considera este Bioma como espaços territoriais especialmente protegidos e no Artigo 197 inciso III define como áreas de proteção permanente os locais que abrigam raros exemplares de fauna e flora. 

A área pretendida para a implantação do Aeródromo Rodoanel integra a Zona de Amortecimento e Conectividade da Reserva da Biosfera do Cinturão Verde da Cidade de São Paulo, que detém desde 1991 o título de Reserva da Biosfera da Mata Atlântica, concedido pela UNESCO, órgão das Nações Unidas, o que lhe confere uma grande importância e reconhecimento internacional. 

4- No local há diversificada riqueza de fauna e ocorrência de espécies incluídas como ameaçadas de extinção nas listas nacional e estadual, dentre elas destacam-se animais como jaguatirica, bugio e cuíca-de-três-listras. Estes dados constam inclusive dos levantamentos elaborados pela empresa contratada pelo empreendedor para fazer os estudos prévios das restrições legais e ambientais ao projeto, que apontam a existência de 2.273 árvores por hectare e registram que na Área de Influência Direta do empreendimento há 193 diferentes espécies arbóreas, 111 espécies de aves, 26 espécies de mamíferos, 20 de répteis e mais de 30 de anfíbios.

5 – Apesar de todos esses motivos, os proponentes do projeto acreditam que uma possível alteração de legislação municipal autorizará a construção. Demonstram, assim, absoluto desdém com a cidade e o seu ordenamento jurídico e exercem todo o seu poder de pressão para fazer valer os seus interesses em detrimento dos interesses da maioria da população. No entanto, os impedimentos jurídicos relativos à proteção ambiental extrapolam a esfera municipal, por se tratar de uma área estratégica e de importância regional. 

A cidade de São Paulo historicamente esteve submetida a este tipo de pressão e o resultado deste jogo nós todos conhecemos: subordinação do interesse público aos interesses de alguns. 

O projeto geraria impactos socioambientais irreversíveis 

Um empreendimento como este provocaria profundas alterações e impactos negativos na região, muitos deles irreversíveis. 

1- Além de todas as especificidades ambientais pontuadas acima, a região de Parelheiros é a que apresenta os dados de maior vulnerabilidade socioeconômica do município.

Um dos impactos previsíveis, a exemplo de outras obras, é que esse empreendimento desencadearia um processo de valorização imobiliária, seguido de processos de especulação com o preço da terra de seu entorno, resultando na expulsão da população pobre que hoje ocupa as proximidades. Esta população fatalmente se deslocaria para áreas mais distantes e mais frágeis do ponto de vista ambiental e exigiria novos e mais expressivos investimentos públicos em infraestrutura urbana e em programas de mitigação dos efeitos desta ocupação sobre os mananciais. Ou seja, espraiaria a mancha urbana. 
Além disso, é uma infraestrutura que demanda novos investimentos e atrai novos usos. 

2- A infraestrutura aeroportuária causará uma desarticulação do modo de vida local, rico em aspectos históricos e culturais com inegável aptidão rural, que resiste às pressões do crescimento urbano nessa região. Isso vai na contramão de um processo de revitalização de remanescentes de áreas agrícolas por meio do estímulo à produção orgânica e um promissor pólo de desenvolvimento de turismo voltado à proteção ambiental e geração de renda para a população local, com diversos projetos custeados pelo poder público, como aqueles apoiados pelos editais do Fundo Especial do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (FEMA), desde 2008. 

3- O projeto prevê uma ligação com o trecho Sul do Rodoanel, rodovia licenciada como classe zero, justamente para não induzir a ocupação urbana. Tal ligação exigiria um novo processo de licenciamento e se aprovada representaria um grande eixo indutor de ocupação, com reflexos não apenas para a Zona Sul, mas também para as demais regiões da cidade por onde o Rodoanel passa e por onde poderiam ser abertos acessos como este. Ademais, a pretendida ligação necessariamente cortaria Unidades de Conservação Municipal já implantadas. 

4- Tais impactos não são contabilizados frente aos expressivos investimentos públicos, das três esferas de governo, que há três décadas são realizados para recuperar os mananciais hídricos abalados pela ocupação urbana, o chamado Programa Mananciais. Projetos com impactos negativos irreversíveis são propostos desarticuladamente e desrespeitando políticas de gestão de recursos hídricos. Estamos vivendo uma crise de abastecimento de água que não se limita à falta de chuvas nos reservatórios, mas a uma falta de gestão e priorização de áreas que precisam ser protegidas para que se mantenham como mananciais, exercendo funções ambientais. 

5- Os mananciais de abastecimento público de água da Região Metropolitana foram e são destruídos por um perverso processo de ocupação predatória e ilegal que, de um lado, revela a incapacidade de as políticas públicas responderem à histórica demanda por moradia e, de outro, resulta da desenfreada especulação e da ganância de alguns grupos que historicamente se serviram da cidade para atender aos seus interesses particulares. Admitir um projeto como este seria ignorar a escassez de água e permitir o avanço do desmatamento e o comprometimento irreversível do sistema Guarapiranga que responde por 30% da água consumida pela cidade. 

Este sistema tão ameaçado ainda contribui para amenizar a atual crise hídrica na RMSP, fornecendo água para áreas que são normalmente abastecidas pelo sistema Cantareira, mas que se encontram no limite do sistema Guarapiranga. 

Além disso, o projeto do aeródromo em Parelheiros compromete uma das mais importantes redes hídricas subterrâneas do município, sua implantação exigiria a busca de novas fontes de água a distâncias cada vez mais longas encarecendo o sistema de captação, tratamento e distribuição, penalizando todo o conjunto da cidade em benefício de poucos. Algo impensável, sobretudo, se levarmos em conta que iniciamos o ano de 2014 com uma crise inédita no sistema de abastecimento de água na cidade de São Paulo e em inúmeras outras cidades do estado. 

6- O terreno possui desníveis de até 50 metros e declividade superior a 30%, segundo dados da Emplasa. Portanto, é extremamente vulnerável a erosões que provocariam o assoreamento de cursos hídricos, gerando consequências no corpo d’água da própria represa. 

7- O aeródromo estaria localizado em meio a importantes áreas de preservação, que são ricas em espécies da avifauna e rotas migratórias, conforme demonstrado em diversos estudos de acadêmicos e das Secretarias do Verde e Meio Ambiente e Secretaria do Estado do Meio Ambiente. Como acontece em outros aeroportos, certamente haveria risco de acidentes provocados por choques entre aeronaves e aves. Além disso, o ruído contínuo emitido pelos aviões altera o ambiente e traz impactos irreversíveis para diversas espécies de animais que utilizam a vocalização como estratégia primária de reprodução (os animais não conseguem competir com o barulho dos aviões para atrair parceiros para a reprodução), dentre eles, aves, anfíbios anuros, mamíferos e alguns insetos, como já verificado após a implantação de estradas e aeroportos em diferentes locais do mundo. Tais impactos alteram, ainda que em escala local, processos cruciais para o funcionamento dos ecossistemas, tais como dispersão de sementes, polinização e disponibilidade de alimento. Como efeitos de longo prazo, podem ocorrer o empobrecimento e degeneração dos fragmentos de vegetação nativa e ambientes existentes dentro e no entorno da área do empreendimento, e em UCs muito próximas. 

A área, por estar localizada em meio a diversas unidades de conservação, possui um papel estratégico, conectando-as e servindo de corredor para a biodiversidade. Há uma conexão direta do ponto exato onde se pretende instalar o Aeroporto com o Parque Estadual da Serra do Mar, ou seja, uma ligação direta da Guarapiranga com a Serra do Mar, fundamental para a manutenção de inúmeros processos e serviços, dos quais somos completamente dependentes. 

8- O intenso tráfego de aeronaves provocaria forte impacto na qualidade do ar pela alta emissão de poluentes. Além disso, o aeródromo geraria resíduos sólidos e efluentes que, mesmo se retirados, contaminariam a região por meio da chamada poluição difusa. Acrescentem-se, ainda, os impactos gerados pelo aumento incalculável no trânsito de caminhões e automóveis naquela zona, já que o empreendimento prevê o atendimento de 300 mil passageiros anualmente e 100 mil pousos e decolagens. 

O projeto não se justifica e se contrapõe ao desenvolvimento sustentável e socialmente justo de Parelheiros 

A Região de Parelheiros possui uma grande extensão territorial de 353,50 Km2, é o maior perímetro de todas as Subprefeituras. Tem uma população de 196.360 habitantes, conforme o Censo 2010, ou seja, 6,7 habitantes por quilômetro quadrado. Trata-se de uma região de alta relevância ambiental, com predomínio de áreas rurais e vegetação nativa. Também apresenta grande grau de vulnerabilidade social e necessita, portanto, de maior atenção do poder público, que tem a oportunidade de oferecer àquela região um tipo de desenvolvimento que não reproduza a destruição socioambiental tão característica do processo de urbanização. Em outras palavras, o modelo de desenvolvimento precisa ser adequado à vocação do local, que não pode ficar refém de um projeto que se apresenta como redentor por oferecer cerca de 2 mil empregos. 

É indispensável, portanto, que a Prefeitura de São Paulo lidere um processo de desenvolvimento com alternativas de trabalho e renda, potencializando iniciativas já em andamento, como o desenvolvimento do turismo, da agricultura orgânica e familiar, e estimulando outras cadeias produtivas que possuam baixo impacto socioambiental e sejam intensivas em mão de obra. Ao mesmo tempo, é mais do que necessário um plano de investimentos para dotar aquela Região de infraestrutura, principalmente nas áreas de saúde e educação. 

Admitir um projeto como o do Aeródromo Rodoanel na Região de Parelheiros seria renunciar ao momento importante que estamos vivendo de revisão do atual Plano Diretor, de forma efetivamente participativa, ou seja, procurando assegurar o direito de todos os cidadãos à cidade e não o atendimento dos interesses econômicos de poucos. 

Tolerar a ingerência dos proponentes do aeródromo e apoiadores para patrocinar alterações na Lei de Zoneamento e no Plano Diretor para atender aos tacanhos interesses privados seria um escândalo, mais que isso, seria negar a cidadania, e a cidade admitiria o triunfo da barbárie urbana.

Assinam esse documento: 

  • Amalia Inés Geraiges de Lemos - Profº. Titular do Departamento de Geografia - FFLCH-USP
  • Ana Fani Alessandri Carlos - Profa. Titular- Geografia-USP
  • Ana Gabriela Akaishi - Profa. FIAM-FAAM, Mestre UFABC, Diretora SASP
  • Antonio Carlos Colangelo - Prof. Associado, Departamento de Geografia USP
  • Arlete Moysés Rodrigues - Prof. Livre docente – UNICAMP
  • Beatriz Bezerra Tone - Doutoranda FAU-USP e Profª. da Universidade São Judas Tadeu
  • Beatriz Kara José - Arquiteta urbanista; Profa. Dra. Centro Universitario SENAC
  • Camila D’Ottaviano - Profa. Dra. FAU-USP
  • Camila Salles - Doutoranda-USP-Geografia
  • Carmen Junqueira - Professora Emérita da PUC/SP
  • Danielle Soares de Azevedo Silva - Ciências Biológicas – UFRPE
  • Danilo Volochko - Prof. Dr. UFMT
  • Dino Mottinelli – Associação Movimento Garça Vermelha
  • Dulcinéia de Fátima Ferreira Pereira - Profª. Dra. Depto. Educação UFSCar
  • Edgard de Assis Carvalho - Professor Titular Depto. de Antropologia PUC/SP
  • Eduardo A. C. Nobre - Prof. Dr. da FAU-USP
  • Eduardo Melander Filho – Prof. e Historiador. Foi Pesquisador em Arqueologia no Museu de Arqueologia e Etnologia da USP
  • Erminia Maricato - Profa. Titular FAU-USP
  • Fabiana Valdoski Ribeiro - Pós Doutoranda em Geografia – Universidade de Barcelona
  • Fabio Schunck - Biólogo, Pesquisador do Museu de Zoologia da USP
  • Francisco Comaru - Prof. Dr. da Universidade Federal do ABC
  • Giselle Megumi Martino Tanaka - Arquiteta e Urbanista, doutoranda IPPUR UFRJ
  • Glória da Anunciação Alves - Professora Titular do Departamento de Geografia -USP
  • Izabel Alvarez - Profa.Dra. Geografia- USP
  • Janes Jorge - Prof. Dr. Dptº. Pós Graduação História UNIFESP
  • João Paulo Capobianco - Biólogo, ambientalista e consultor
  • João Sette Whitaker Ferreira – Prof. Livre Docente da FAU-USP
  • José Celso Martinez Corrêa - Conselheiro da Cidade / Teatro Oficina
  • Karina Oliveira Leitão - Profa. Dra. FAU-USP
  • Laisa Eleonora Marostica Stroher - Mestranda FAU-USP - Diretora do Sindicato dos Arquitetos (SASP)
  • Leandro Garcez Targa - Doutorando em Ciência Política – Univ. Federal de São Carlos
  • Leandro Garcez Targa - Doutorando em Ciência Política –Universidade Federal de São Carlos
  • Leandro Grazes Targa - Doutorando- Ciência Politica - USP - São Carlos
  • Leo Ramos Malagoli - Biólogo, mestre e doutorando em Zoologia Unesp Rio Claro
  • Licio Gonzaga Lobo Junior - Arquiteto e Urbanista, Mestre pela UFABC, diretor do SASP
  • Lucia Zanin Shimbo - Profa. Dra. IAU/USP
  • Luís Maurício Martins Borges - Doutorando em Desenvolvimento Econômico IE-Unicamp
  • Magno de Lara Madeira Filho - Doutorando – UNESP - Rio Claro
  • Manuel Rolando Berríos - Prof. Dr. Do DEPLAN/IGCE curso de pós-graduação Geografia. UNESP-R. Claro
  • Marcelo Montaño - Prof. Dr. Escola de Engenharia de São Carlos/USP
  • Marcia M. Hirata - Profa. Dra. Universidade Federal de São João Del Rei
  • Margareth Matiko Uemura - Instituto Polis
  • Maria Beatriz Cruz Rufino - Profa. Dra. FAU-USP
  • Maria de Lourdes Zuquim - Profa. Dra. FAU-USP
  • Maria Lucia Ramos Bellenzani - Engenheira Agrônoma, Mestre em Ciência Ambiental
  • Maria Lucia Refinetti Martins - Profa. Titular FAU-USP
  • Maria Rita Kehl - Psicanalista, ensaísta, crítica literária e poetisa. Integrante da Comissão da Verdade
  • Marijane Vieira Lisboa - Profa. Dra.Dptº. Sociologia PUC SP
  • Marísia Margarida Santiago Buitoni - Profa. Dra. de Geografia PUC-SP e UERJ
  • Maurilio Ribeiro Chiaretti - Mestrando FAU-USP e presidente do SASP
  • Mauro Scarpinatti - Economista, mestre pela PUC-SP, Prof. Universidade Nove de Julho
  • Mônica Pilz Borba - Instituto 5 Elementos
  • Nilto Tatto - Instituto Socioambiental –ISA
  • Norma Valencio - Profª. Dra. Depto Sociologia UFSCar e Profª. Col. PPG Engenharia Ambiental USP
  • Patrícia Rodrigues Samora - Profa. Dra UNIV. s. Judas Tadeu e Centro Universitário SENAC
  • Paula de Oliveira - Arquiteta Urbanista e Pesquisadora Doutora do LabHab FAU-USP
  • Paula Freire Santoro - Profa. Dra. FAU-USP
  • Paulo Henrique Martinez - Prof. Dr. Departamento de História UNESP/Assis
  • Pedro F. Develey - Biólogo, doutor em ecologia USP Diretor da SAVE Brasil
  • Pedro Roberto Jacobi - Prof. Livre Docente Faculdade de Educação e do PROCAM/IEE – USP
  • Rafael Borges Pereira - Arquiteto Urbanista, Mestrando FAU-USP
  • Rafael Faleiros de Pádua - Prof. Dr. UFMT
  • Raquel Rolnik - Prof. Dra. FAU-USP
  • Regina C.Bega dos Santos - Profa. Dra. Geografia - UNICAMP
  • Regina Maria d’Aquino Fonseca Gadelha - Profª. Dra. Titular do Depto. Economia-FEA-PUC/SP
  • Renato Cymbalista - Prof. Dr. Da FAU-USP
  • Rita de Cássia Ariza da Cruz - Prof. Dra. Geografia -USP
  • Rodrigo Lilla Manzioni - Prof. Dr. UNESP-Ourinhos
  • Rubens Harry Born - Doutor em Saúde Pública, membro Fórum Brasileiro de Mudança de Clima
  • Tamires Almeida Lima - Pesquisadora LabHab FAU-USP
  • Tatiane M. P. de Godoy - Profº. Dra. Universidade Federal de São João del Rei.
  • Tatiane Marina Pinto de Godoy - Profa. Dra. UF de São João Del Rei
  • Vagner Cavarzere Jr - Mestre e doutorando em Zoologia USP
  • Vilma Clarice Geraldi - Medica Veterinária
  • Vinicius de Souza Almeida - Mestrando Prog. Ciências Ambientais – USP
  • Wagner Costa Ribeiro - Professor Titular Dep. Geografia –USP - PPG Ciência Ambiental – USP
  • Wilson Ribeiro dos Santos Junior - Docente Programa de Pós-Graduação em Urbanismo POSURB PUC-Campinas

Parecer contrário à construção do Aeródromo Harpia em Parelheiros do Conselho Gestor da APA Bororé-Colônia




O Conselho Gestor da APA (Área de Proteção Ambiental) Bororé-Colônia aprovou em reunião ordinária realizada em 29.04.2014 na Subprefeitura da Capela do Socorro, parecer contrário à construção do “aeroporto de Parelheiros”.
O assunto vinha sendo discutido intensamente pelo Conselho desde as conclusões preliminares advindas da reunião da Câmara Técnica Conjunta de Uso do Solo das APAs Capivari-Monos e Bororé-Colônia, realizada em 14 de novembro de 2013.
Lembramos que a APA Bororé-Colônia abrange uma área que está sob jurisdição das Subprefeituras CAPELA DO SOCORRO E PARELHEIROS, cada qual com sua parcela territorial.
O Conselho Gestor da APA Bororé-Colônia é composto por importantes e representativas lideranças da sociedade civil de ambas as regiões (Capela e Parelheiros), além de técnicos de grande competência de duas esferas do poder público: estadual e municipal.
Abaixo, o texto aprovado pelo Conselho:  
‘MANIFESTO DA ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL (APA) BORORÉ-COLÔNIA SOBRE O AERÓDROMO DA EMPRESA HARPIA LOGÍSTICA LTDA. EM PARELHEIROS
O Conselho Gestor da Área de Proteção Ambiental (APA) Bororé-Colônia vem se manifestar com relação ao empreendimento denominado Aeródromo Harpia, a ser implantado no distrito de Parelheiros, em local denominado Fazenda da Ilha, de responsabilidade da empresa Harpia Logística Ltda.
• Considerando que a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano de São Paulo – SMDU – através do DESPACHO/SMDU/DEUSO 238/2013 – com base no art. 13 da Lei nº 14.141/06, INDEFERE o requerimento de expedição de certidão de uso e ocupação do solo POR FALTA DE AMPARO LEGAL;
• Considerando decisão da Secretaria dos Negócios Jurídicos do Município de São Paulo, através da Procuradoria Geral do Município, que ratifica decisão de SMDU e que considera INADMISSÍVEL A INSTALAÇÃO DE AERÓDROMOS NAS ZONAS DE PROTEÇÃO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL (ZPDS) E NAS ZONAS ESPECIAIS DE PROTEÇÃO AMBIENTAL (ZEPAM);
• Considerando manifestação da SVMA perante EIA-RIMA-Processo CETESB nº 26/2012, em conformidade com Resolução CONAMA 237/97, art. 5º, Parágrafo Único – através do PARECER TÉCNICO Nº 001/DECONT2/GTAIA/2014 – que, após estudos sobre Meio Socioeconômico, Meio Físico, Meio Biótico e considerando impactos sobre a perda de permeabilidade, alteração do relevo, lençol freático superficial, qualidade do ar, aumento do nível de ruído, alteração na qualidade do solo, Unidades de Conservação, Área de Preservação Permanente (APP), áreas verdes, vegetação e fauna, adjetiva como: “inadmissível a construção do Aeródromo harpia, na Área de Proteção aos Mananciais na Região Metropolitana de São Paulo”, justificada pela incompatibilidade com o zoneamento do PDE, impacto significativo, não identificação de justificativa de interesse público e sobreposição a legislação nas três esferas de poder: Proteção aos Mananciais, Zoneamento (Uso do Solo) e Zona de Amortecimento das UCs; concluindo, portanto que: “...a implantação e operação do empreendimento causarão interferências significativas no meio físico e biótico, CAPAZES DE ALTERAR AS CONDIÇÕES ATUAIS DE PRODUÇÃO E QUALIDADE DAS ÁGUAS DOS MANANCIAIS, não havendo justificativa plausível no campo do interesse público que possa compensar interesse maior de produção de água para 4.000.000 (quatro milhões) de habitantes”;
• E, considerando o debate promovido através da Câmara Técnica Conjunta de Uso do Solo das APAs Capivari-Monos e Bororé-Colônia, em 14 de novembro de 2013;
MANIFESTAMO-NOS PLENAMENTE CONTRÁRIOS À IMPLANTAÇÃO DO AERÓDROMO HARPIA.
O caso do pedido para implantação do aeródromo privado da empresa Harpia na zona Sul da cidade de São Paulo transformou-se em um exemplo de atendimento de interesses privados em detrimento da legislação ambiental vigente.
Mesmo recebendo uma série de negativas da Prefeitura de São Paulo, mesmo havendo uma série de manifestações civis de histórico de luta ambientalista contrários e mesmo havendo fontes acadêmico-científicas de credibilidade posicionando-se contra, ainda assim os empreendedores continuam insistindo na permissão para construção.
A justificativa fundamental utilizada pela Prefeitura para negar o pedido é em relação aos atributos da região escolhida para sua implantação, no caso o distrito de Parelheiros, junto à várzea do Rio Embu-Guaçu, limite com o município de Embu-Guaçu, no bairro do Jaceguava.
Trata-se de área com todas as características ambientais para garantir a produção de água, pela densa e preservada rede de drenagem e reservatório subterrâneo de grandes volumes, além de ser um dos maciços florestais contínuos de maior área no território paulista, garantindo o corredor ecológico que comunica a Bacia da Guarapiranga com a Bacia do Capivari-Monos e Billings e com a mata mais preservada na Serra do Mar.
O Rio Embu Guaçu é o maior contribuinte da Represa Guarapiranga, que abastece cerca de 30% dos cidadãos paulistanos. Por este motivo, o instrumento fundamental de planejamento da cidade, o Plano Diretor Estratégico, classificou a área como Zona Especial de Proteção Ambiental (ZEPAM), na qual não é permitida instalação de um aeroporto, dentre outros.
Exemplifica a importância ambiental da área o fato de estar sob responsabilidade dos poderes Federal, Estadual e Municipal.
A CIDADE DE SÃO PAULO ESTÁ PASSANDO POR UMA ALARMANTE CRISE DE ABASTECIMENTO, DEVIDA A ESCASSEZ NO SISTEMA CANTAREIRA. Os mananciais sul da RMSP também já operam no limite, porém ainda dispõem de água em quantidade suficiente para atender a demanda. Aprovado o aeródromo na várzea do Rio Embu-Guaçu é provável que haja considerável queda na vazão, além do comprometimento da qualidade da água, prejudicando ainda mais o abastecimento da população como um todo.
Não obstante, a área apresenta um conjunto de fatores físico-ambientais completamente desfavoráveis para instalação de um aeroporto, como o relevo acidentado formado por morros característicos do planalto paulistano, próxima a Serra do Mar. Além de área de cabeceiras de drenagem, o relevo exigiria monumental movimentação de terra e supressão de nascentes e aqüíferos.
Além do relevo, a área apresenta grande incidência diária de neblina, fortes rajadas de vento e aves migratórias de médio e grande porte, configurando o cenário ideal para acidentes aéreos.
Mesmo com este quadro contrário à construção do aeroporto, os empreendedores pleiteiam uma emenda para incorporar o empreendimento na revisão em andamento do Plano Diretor Estratégico.
Não concordamos com a postura dos vereadores favoráveis à inserção o empreendimento que já foi negado em três instâncias, pelo próprio município que representam, na própria ferramenta de planejamento da cidade de São Paulo.
Entendemos que esta iniciativa se dá à revelia da legislação ambiental, pois desconsidera a avaliação dos órgãos responsáveis pela análise do projeto que, sob critérios técnicos, enfatiza a inexistência de aval legal para sua aprovação.
Certo número de moradores de Parelheiros também são favoráveis ao aeroporto privado por conta das promessas de emprego e escola deste empreendimento em uma região carente de investimentos públicos. Contudo, estas promessas pontuais não representam o irreparável impacto social e ambiental de um aeroporto em espaço produtor de água.
Conforme já constatado, o argumento do interesse público não se justifica. A afirmativa que alega a criação de postos de trabalho como justificativa para o empreendimento não deve sobrepor a legislação vigente e os impactos ambientais permanentes que serão causados.
Não há como sobrepor a geração de alguns empregos ao abastecimento de água de milhões de pessoas, especialmente sem questionamentos sobre o caráter destas vagas e requisitos para seu preenchimento.
Qual o real interesse público nesse sentido? Ou seria argumento para atrair aprovação popular para um projeto impraticável do ponto de vista legal. Em outros termos, licenciar e aprovar o que não é passível de aprovação.
Abaixo outros argumentos contrários à implantação do referido empreendimento:
(a) O Sistema Guarapiranga fornece água para boa parte da zona Sul de São Paulo, abrangendo outras Subprefeituras, de modo que tanto as Subs como a população devem ser consultados;
(b) É necessário maior esclarecimento acerca do enquadramento do aeroporto, pois seu Estudo de Impacto Ambiental denomina como “aeródromo civil público para serviços privados”. Como se justifica o termo “público” sendo empreendimento declaradamente privado?
(c) O Estudo de Impacto Ambiental protocolado argumenta que as áreas de mananciais tem aptidão para comportar infraestruturas que articulem centros de logística para conectar diversos centros urbanos. Deste ponto de vista, abre-se possibilidade para que os espaços florestados existentes nas áreas de mananciais possam ser ocupados por rodovias, ferrovias e infraestruturas diversas altamente poluidoras que não trazem benefícios locais;
(d) O sistema viário de acesso ao aeroporto não condiz com a nova estrutura gerada, no caso de sua construção, sendo necessária a reestruturação das ruas locais. A abertura da alça de acesso do Rodoanel, vetada para instalação do anel viário, está indicada como uma solução possível no Estudo de Impacto Ambiental, exclusivo para acesso ao aeroporto privado, contrariando o condicionante para aprovação do próprio Rodoanel Sul;
(e) Historicamente todas as áreas do entorno de aeroportos na cidade de São Paulo, à exemplo de Guarulhos e Cumbica, eram áreas de mata que sofreram um grande adensamento urbano. O aeroporto privado será um grande atrativo para valorização dos terrenos e conseqüente especulação imobiliária e novas ocupações;
(f) Deve ser questionado, qual tipo de desenvolvimento as autoridades pretendem para as áreas de mananciais do extremo sul de São Paulo: um desenvolvimento compatível com os atributos naturais, sustentável, pautado em atividades compatíveis a serem melhor estimuladas (agricultura, ecoturismo, parques, infraestrutura rural, pagamentos por serviços ambientais, fiscalização) ou a instalação de grandes empreendimentos poluidores e impactantes, que há décadas trazem o emblema do progresso, sempre beneficiando pequenos grupos econômicos;
(g) Os parques propostos pelo empreendedor para o entorno do aeroporto serão somente áreas verdes de baixa biodiversidade em termos biológicos e ecossistêmicos. A maior parte da fauna tenderá a se afastar do local pelo barulho gerado pelos aviões e veículos de grande porte necessários para a logística de um aeroporto;
(h) Existe um manifesto contrário ao aeroporto assinado por um grande número de urbanistas que estão se posicionando nas Audiências Públicas do Plano Diretor Estratégico.
De forma conclusiva, em época de crise e escassez de água na cidade de São Paulo está sendo cogitada a inclusão no instrumento de planejamento da cidade (Plano Diretor Estratégico) um empreendimento: (1) privado; (2) altamente poluidor; (3) em uma área que produz e abastece água para os cidadãos paulistanos; (4) negado por todos os órgãos consultados da Prefeitura de São Paulo; (5) sem ser considerada a legislação vigente no território sob responsabilidade das três esferas de poder: federal, estadual e municipal.’
São Paulo, 29 de abril de 2014
CONSELHO GESTOR DA APA BORORÉ-COLÔNIA