Transcrição das Notas Taquigráficas: Pronunciamento de Ítalo Cardoso sobre o MOGAVE e o Parque Nove de Julho

Calçadão do Parque Nove de Julho: uma verdadeira Muralha da China

Conseguimos, finalmente, a transcrição das notas taquigráficas do pronunciamento do vereador Ítalo Cardoso na Câmara Municipal de São Paulo, o que já foi objeto de comentário em artigo no nosso blog. intitulado “Ações do MOGAVE Finalmente em Evidência na Grande Imprensa”.

Essa transcrição foi remetida ao Ministério Público pela Mesa Diretora da Câmara Municipal da Cidade de São Paulo a pedido do próprio vereador e anexada ao Inquérito Civil que corre na Primeira Promotoria do Meio Ambiente para apurar as irregularidades das obras no Parque Nove de Julho efetuadas pela subprefeitura da Capela do Socorro.

Abaixo, publicamos a transcrição completa:

“GRANDE EXPEDIENTE de 08 abr 2010.

O SR. PRESIDENTE (Celso Jatene - PTB) - Por cessão de tempo da nobre Vereadora Juliana Cardoso, tem a palavra o nobre Vereador Ítalo Cardoso.

O SR. ÍTALO CARDOSO (PT) - (Sem revisão do orador) - Sr. Presidente, Sras. e Srs. Vereadores, telespectadores da TV Câmara São Paulo, jovens presentes e representantes do movimento ambientalista da Região Sul, da Garça Vermelha que, já há vários meses, procuram diversos Vereadores desta Casa, de diferentes partidos, para falar de uma preocupação que, a bem da verdade, não é somente dos moradores daquela região do Jardim Sertãozinho, mas diz respeito à qualidade da água, da vida, à preservação de um patrimônio ambiental da população da cidade de São Paulo, a Represa Guarapiranga, na região de Capela do Socorro.

Foi criado o Movimento Garça Vermelha em alusão a essa espécie de garça que existe unicamente naquele espaço, naquela região. É uma ave em extinção, muito bonita, tem uma cor avermelhada, por isso o nome do Movimento Garça Vermelha, liderado e conduzido por moradores daquela região.

Poucos conhecem esse movimento, pois não foi criado com a intenção de ganhar dimensões na Cidade. Foi criado por essa demanda localizada e reúne os moradores da região para tratar de suas preocupações com relação à preservação daquela área. Vários Srs. Vereadores, entre eles Alfredinho e Arselino Tatto, foram procurados pela liderança desse movimento para tratar da preservação da região. Os líderes fizeram um requerimento que lerei para não cometer nenhuma injustiça com aquilo que pretendem quando querem justificar o movimento. E mostrarei, com fotos, do que trata a defesa daquela região.

- É lido o seguinte:

‘REQUERIMENTO

Nós, os moradores do Jardim Sertãozinho e das regiões adjacentes, e como uma exigência nossa por direito, diante do exposto, e por entendermos como justo e correto, requeremos ao Sr. Subprefeito que sejam retiradas do projeto do Parque 9 de Julho a (i) pretensão da construção de uma rua à margem da Represa Guarapiranga no local, bem como a (ii) pretensão de construção de portões de acesso ilimitado à represa, solicitações que contribuirão para preservar a Guarapiranga e a qualidade de sua água que é servida diariamente aos paulistanos. E fazemos isso com o firme propósito de proteger a represa e sua água, nesse entorno do Jardim Sertãozinho e vizinhanças, de uma potencial degradação do meio ambiente que a cerca por aqui, pois fatalmente é isso que ocorrerá, com o advento de uma rua, asfalto, carros, motos, estacionamentos, sujeira, poluição, etc.

E ao assim requerermos, certamente estarão de acordo com a nossa posição os moradores de outros trechos da Guarapiranga que têm as mesmas características do Jardim Sertãozinho, isto é, trechos de alta preservação, mais vocacionados à proteção da flora, da fauna e da água e com ênfase, se for o caso, para trilhas voltadas para caminhadas de contemplação, ou mesmo ciclovias bem adaptadas ao trecho.

Certamente, os moradores dessas outras regiões, com características semelhantes, compartilharão da opinião deste manifesto e a ele aderirão, quando forem apropriadamente informados, o que, ao que parece, não está acontecendo. E também certamente, concordará com o seu teor, o Ministério Público, instituição a quem cabe defender o chamado direito difuso, aquele direito que se difunde e atinge a muitos, como é o direito de proteção de uma represa que serve água diariamente para mais de três milhões de pessoas e que carece de proteção permanente, como utilidade pública maior.

Esse requerimento se apóia no princípio da prevenção (antes que a degradação irreversível ocorra), presente em todas as legislações com relação à proteção ambiental, inclusive na legislação brasileira abaixo, considerando que a lei está acima de tudo, até mesmo de eventuais acordos feitos com qualquer parte, inclusive o Banco Mundial.

Legislação básica: (a) Leis Federais - lei 7.347/85 (Ação Civil Pública); lei 6.902/81 (sobre Áreas de Proteção Ambiental); lei 9.605/98 (sobre crimes ambientais); lei 5.197/67 (sobre a fauna silvestre); lei 4.771/65 (sobre a proteção das florestas); lei 6.938/81 (sobre a política nacional do meio ambiente); lei 9.433/97 (sobre os recursos hídricos); lei 10.257/2001 (Estatuto da Cidade); (b) Leis Estaduais (SP) - lei 9.509/97 (Políticas Estaduais de Meio Ambiente), lei 7.663/91(sobre recursos hídricos); lei 9.866/97 (lei de Proteção aos Mananciais); leis 898/75 e 1.172/76 (disciplina o uso do solo para a proteção dos mananciais, cursos e reservatórios de águas); lei 12.233/06 e Decreto 51.686/07 (específica sobre a Represa Guarapiranga); (c) Municipais - Planos Diretores da cidade de São Paulo e demais legislação municipal pertinente. A legislação básica, no caso, além da Constituição Federal, é a lei nº 9.866/97 de Proteção aos Mananciais.

Queremos crer também, os moradores locais, que esses projetos estejam amparados pelo devido licenciamento ambiental com a correspondente licença. E que os órgãos que têm o poder de licenciar tal obra, como a Secretaria Estadual do Meio Ambiente, tenham analisado, previamente, o impacto ambiental dessa "rua", no bojo da concessão do licenciamento ambiental. E a licença deve ficar à disposição de qualquer munícipe, como um direito constitucional (art. 5º da CF-88-inciso XXXIII) de acesso a documentos públicos.

Além do requerimento da não implantação da pretendida rua, requeremos também que o acesso à parte da represa, no entorno do Jardim Sertãozinho, pelo seu valor de trilha para contemplação (para pedestres), seja restrito, sem a construção dos portões na forma, local e quantidade que a Prefeitura pretende no trecho do Jardim Sertãozinho, considerando que essa medida servirá, primordialmente, para proteger também o meio ambiente e a água da represa. E essa proteção não constituirá qualquer óbice ou restrição à entrada de pessoas, mas apenas um controle, como outros controles existentes em outros sítios ambientais, perfeitamente aceitos pelos usuários, devido sua nobre missão, a de proteger, restringindo, porém sem proibir a entrada.

Queremos também, neste ato, o acesso imediato, a qualquer dos moradores (e a qualquer cidadão) ao licenciamento ambiental dessa pretendida rua.
Agradecemos a compreensão, a aceitação e o atendimento deste requerimento, como medida de JUSTIÇA!

São Paulo, 15 de dezembro de 2.009

MOVIMENTO GARÇA VERMELHA

’NINGUÉM É TÃO BOM, COMO TODOS NÓS JUNTOS’.’

O SR. ÍTALO CARDOSO (PT) - Como ouviram os senhores, trata-se de um requerimento feito no ano passado.

A Prefeitura anunciou seus projetos de parques lineares, projetos esses, inclusive, que aplaudimos muito porque, realmente, em vários locais, eles protegem, dão outra utilidade a espaços da Cidade que estavam degradados.

- O Sr. Ítalo Cardoso passa a referir-se às imagens na tela de projeção.

O SR. ÍTALO CARDOSO (PT) - Sr. Presidente, não é este o caso aqui. Nós mostramos uma parte desse píer, que foi implantado, e está localizado no Parque da Barragem da Represa de Guarapiranga, na Capela do Socorro. Ele dá vazão para a água da represa, portanto, é perfeitamente possível, quando encher, quando houver a chegada das águas, passar para o outro lado. Ali o que se vê é um bloco grande de concreto, um muro, como se fosse a Muralha da China, no meio da represa.

A outra foto vai mostrar, ali onde tem uma vaca, que é uma região ainda preservada e importante para a nossa cidade, que teve um verdadeiro muro de contenção de água construído no meio, pela Subprefeitura de Capela do Socorro acompanhada, acredito, da Secretaria do Verde. Isso não tem nada de ecológico ou de preservação. A bem da verdade, essa parte está onde ninguém vê, porque o Jardim Sertãozinho fica no fundo, perto da OSEC, em área de difícil acesso, por isso a Imprensa não vai mostrar esse crime cometido contra nosso patrimônio ambiental.

A outra parte que mostrei anteriormente fica às margens da Represa Kennedy. E quem vê dirá: "Nossa, que obra bonita! Que cuidado com o meio ambiente, com a represa, com a vazão da água!".

O Sr. Natalini (PSDB) - Com qual objetivo?

O SR. ÍTALO CARDOSO (PT) - Infelizmente, não sei qual foi o objetivo. Foi dito que a obra foi feita para criar um passeio para a população que, naquela região, é carente e quer, sim, área de lazer, de contemplação, mas, como pedem os moradores, que seja uma área de contemplação e de caminhada, e não um local como esse.

Aquele local - a vaca praticamente encobre - é uma parte do projeto ao qual a Imprensa tem acesso, chamada "para inglês ver". A outra parte é concreto no chão, sabe-se lá quantos metros para baixo. Daqui a pouco vem a cheia e vai cobrir essa calçada e depois, na vazão, teremos uma piscina que poderá ser usada pelos bois, como vemos, mas não há nenhuma preocupação.

Junto com esse há outro projeto que a população local solicita que não se realize. Peço o cuidado de não tombar parte da mata preservada, onde está sendo feito, inclusive, um passeio em volta da represa, sem objetivo determinado - seria para atender a qual necessidade?
Derrubam árvores sem o devido cuidado ambiental, nem possuem documentação atualizada. A população não tem acesso - como pede aqui o documento - à autorização para essa obra e, quando tiver, queremos saber qual foi o técnico que a assinou. Tanto que o Ministério Público embargou a obra, porque também não teve acesso à licença, nem a nenhum documento que autorizasse esse crime que ocorreu às margens da Represa Guarapiranga, mais especificamente no Jardim Sertãozinho.

Chamo a população da Cidade à luta, uma vez que o objetivo não se restringe apenas à preservação da qualidade de vida dos moradores do Jardim Sertãozinho. Afinal, parece que há algo enterrado nessa região da cidade de São Paulo. É perto de onde, em 1993, o nobre Vereador Natalini lutou para que o ex-Prefeito Paulo Maluf não instalasse incineradores de lixo.

Naquele local, a EMAE - Empresa Metropolitana de Águas e Energia, começa outra obra de flotação e os moradores do Jardim IV Centenário, do Jardim Primavera e de todo aquele fundão, não aguentam mais a quantidade de pernilongos e pediu ajuda ao Ministério Público. Quando questionada, a EMAE disse que era esgoto da Cidade Ademar. Apelidaram, inclusive, de "penicão". Felizmente, após luta dos moradores, colocaram um inibidor de odores, mas essa obra também foi embargada pelo Ministério Público, porque não sabem onde colocar o lodo que há embaixo da represa, a mesma lagoa onde a EMAE fará a obra.

Agradeço à nobre Vereadora Juliana Cardoso que me cedeu parte do seu tempo, pois tenho certeza de que o que faço hoje não é uma intervenção própria de Grande Expediente, mas um manifesto para o qual conto com a ajuda dos Vereadores da Situação desta Casa.
Não se trata de postura adotada por Situação ou Oposição, é uma necessidade de lutar pela qualidade de vida na cidade de São Paulo, devido à degradação da água de uma região que abastece 3 milhões de paulistanos, que têm, hoje, o seu lençol freático comprometido pela indústria, motivo de denúncia nossa nesta Casa. Mas agora é uma obra oficial, da Prefeitura, da Subprefeitura de Capela do Socorro que fez esse verdadeiro dique, esse "muro da vergonha" que hoje, como mostramos, separa uma parte da represa, impedindo a água de voltar, infelizmente, porque lá estarão blocos e paredes de concreto.

Que executem o mesmo que foi feito na frente, perto da Represa Guarapiranga, onde os donos dos barcos vão passear. Naquele local, tomaram cuidado, empregaram blocos de forma ecologicamente correta, uma construção que permite a vazão da água. Não como fizeram na frente do Jardim Sertãozinho, uma represa dentro da outra. Fizeram uma piscina que não sei a quem serve.

Peço providências aos nobres Vereadores, não só do PSDB, mas também do Ministério Público - se estiver me ouvindo.

Sr. Presidente, requeiro que cópia desse meu pronunciamento seja enviado ao Ministério Público Ambiental, em nome não só deste Vereador, mas de entidades que acompanham o movimento ambiental, especialmente o Observatório Ambiental, o Garça Vermelha e o Repisa.

Muito obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Celso Jatene - PTB) - Deferido.”

FONTE:

GRANDE Expediente de 08 abr 2010: Discurso de Ítalo Cardoso na Câmara Municipal de São Paulo. Diário Oficial do Estado de São Paulo (DOSP), São Paulo, 15 mai 2010. Cidade, p. 110.

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